segunda-feira, 17 de novembro de 2008

Afeto à distância


Allan do blog: Carta da Itália

Afeto à distância

Em meados de 2000 o governo italiano estudava investimentos em países do terceiro mundo com a finalidade de reduzir a imigração clandestina. Um amigo argentino à época: “Eles vão construir semáforos pra gente poder trabalhar como flanelinha por lá mesmo.” Polêmicas e conjecturas se alternaram com os políticos que entupiam tvs e jornais, como se todos não soubessem tratar-se de mais uma cortina de fumaça. No ano seguinte o mundo mudou, o medo de imigrantes aumentou e o assunto sumiu.

Parte da população europeia aproveita cada desculpa para reafirmar que estrangeiro bom é aquele que permanece no próprio país, recebendo bem os turistas em viagens de férias ou de turismo sexual. Outra parte dessa mesma população não vê barreiras para uma convivência pacífica e civilizada. E é esta gente que engrossa as estatísticas da benificência e que vê na adoção a resolução de muitos problemas, seja por escolha ou pela incapacidade de gerar filhos. Nesses casos, a adoção de crianças estrangeiras acaba prevalecendo sobre as outras possibilidades, como a “adoção temporária”, nos casos de pais impossibilitados de educarem ou cuidarem corretamente dos filhos.

Mas existe uma outra solução, em que crianças do terceiro mundo podem ser adotadas à distância. Para isso, basta ser maior e não precisa ser casado. O candidato se apresenta a uma das muitas entidades que promovem a adoção à distância – sempre ligadas a algum movimento religioso e muito controladas – e contribuir com uma pequena soma mensal. Do outtro lado do mundo, esse dinheiro servirá para comprar alimentação, roupas e remédios a alguma criança, que não poderá deixar a escola e cujo responsável deve andar na linha. Não é incomum que um dos pais seja um presidiário ou que os pais sejam separados, mas quem for o tutor da criança deve realmente seguir uma vida exemplar.

Cartas e fotos serão trocadas e cartões de boas festas chegarão sempre pontuais. Uma visita, pelo menos, será organizada para possibilitar um contato pessoal do pai adotivo com a criança na realidade em que ela vive.

Nunca ouviu falar de adoção à distância e está achando que é uma nova moda? Pesquise na net o termo “adoção à distância” em qualquer língua e espante-se com o resultado.

E, não, não é como construir os semáforos do meu amigo argentino. É uma forma de se ocupar de alguém que necessita de ajuda. Conheço pessoas que financiaram até a faculdade do filho “adotado”. Um desses filhos – hoje dentista – mudou-se para a Itália para cuidar dos pais adotivos, um casal de operários aposentados, sem filhos, velinhos e doentes. A irmã, também dentista graças a uma outra adoção, é quem está cuidando do consultório com a ajuda da futura cunhada.

Nesses anos de Itália descobri como é imenso o exército de voluntários sociais e benfeitores, e de quanto esse exército é importante para a comunidade e para milhares de anônimos mundo afora. Por outro lado, nos últimos anos notei que os semáforos de Piacenza foram substituídos por rotatórias.
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Fazendo parte da blogagem: Adocao, um ato de nobreza!

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